sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Depoimento de Sheila Sá

Conheci Tsiipré no início dos anos 80 quando da atuação da Comissão Pró-Índio do Rio de Janeiro. Confesso que eu, à época uma jovem antropóloga recém formada, tomei um susto com aquela “figura” a minha frente. Eu me deparei com um rapaz, jovem indigenista, que trazia em si os signos da classe média branca carioca, encarnado de índio Xavante e que em nome da amizade com os índios, vinha buscar apoio na defesa dos direitos territoriais dos Guarani  no Rio de Janeiro. Ele havia estado com Argemiro Karaí Tataendê (cacique da Terra Indígena Guarani, já falecido) e seu filho Aparício R´Okadju,  no Sertão do Bracuí, município de Angra dos Reis, e pretendia ajudá-los a conseguir a demarcação de seu território, para que sua família e parentes não fossem expulsos de suas terras por supostos proprietários.

Foi didático conhecer Tsiipré. Com ele e muitos outros amigos ajudamos a impulsionar o reconhecimento oficial do território Guarani no Rio de Janeiro. A Terra Indígena Guarani de Bracuí foi  homologada pelo Presidente da República em 1995.

E num certo dia, no início dos anos 2000, Luiz Filipe de Figueiredo entra em minha sala de trabalho no Museu do Índio, já um pesquisador e profissional na área da terapia corporal, e me diz: “Estou escrevendo um livro sobre a minha história de vida e preciso fazer uma pesquisa nos arquivos do Museu para avivar a memória sobre a demarcação da terra Guarani do Bracuí”. Tsiipré conta no livro sua versão das muitas histórias que ocorreram naquele tempo. Partilha com os leitores suas visões, sua busca por explicação de si e de seu tempo e a necessidade de superar os obstáculos, por meio de uma grande viagem terrestre e espiritual, para alcançar por merecimento, o Cachimbo Sagrado dos índios Sioux.

A trajetória de vida de Tsiipré é uma verdadeira aventura de ser e estar no mundo. Um exercício de respeito ao outro. Sua história é sonho e realidade que se fundem e se concretizam num espaço e tempo de dimensões que ultrapassam a compreensão daqueles que se limitam na percepção das múltiplas possibilidades do ser humano. Sua escrita de vida é polêmica e mágica. Longe de uma tentativa acadêmica ou de uma memória crítica, Tsiipré conta sua história e emociona porque é honesto com aquilo que acredita. E é assim que narra com vigor suas verdades e seus sentimentos. Para lê-lo é preciso estar aberto para aquilo que é imponderável, espiritual e onírico, e ao mesmo tempo real e concreto para si.

Não vou aqui destacar nenhum trecho do livro. Peço licença para contar uma passagem vivida mais recentemente com Tsiipré.

Num certo dia de novembro de 2009 estava no Museu do Índio fazendo suporte logístico de um Seminário com os índios Xavante da Aldeia Pimentel Barbosa no Mato Grosso, quando Luiz Filipe, sem saber da presença dos Xavante no Rio de Janeiro, adentrou nos jardins do Museu. Ele se dirigiu aos jovens Xavante participantes da oficina de vídeo que faziam um exercício de filmagem nos jardins e os saudou na língua Xavante. Imediatamente um dos jovens entrou no auditório do Museu onde estávamos trabalhando com algumas lideranças e o velho cacique e anunciou sorridente e perplexo: “Chegou um parente nosso!”. Em um ato contínuo o cacique levantou e foi para o jardim ao encontro do grupo. Chegou de cara fechada fazendo perguntas ao visitante na língua. Ao que ele respondeu e em seguida começou a cantar um canto ritual. Na seqüência tudo virou uma festa. Todos responderam ao canto e começaram a dançar. Luiz Filipe dançava e cantava com os mais velhos e os jovens Xavantes  filmavam e fotografavam. Um pesquisador    que acompanhava a oficina chegou e perguntou a um dos jovens Xavante com a câmera na mão. “O que é que esta acontecendo?”. O jovem Xavante respondeu: “Encontramos aqui com Tsiipré nosso parente que a gente não conhecia... Ele é de outra aldeia.... Estou filmando ele para mostrar lá na nossa aldeia.... É bom que todos conheçam esse parente...”

Da minha leitura do livro Uma Jornada no Tempo: Das Visões ao Cachimbo Sagrado, de Luiz Filipe Tsiipré de Figueiredo, fica a recomendação para todos aqueles que tenham a curiosidade de apreender a riqueza da experiência  de convivência com os muitos outros.

Sheila Sá
Rio de Janeiro, junho de 2010.

Um comentário:

  1. olá tisiipré
    terminei lê o seu livro ao tempo em q lhe parabenizo por este trabalho maravilhoso
    durante a leitura eu me senti cada vez mas envolvido não queria para de lê,nesta era da pré regeneração na qual o nosso planeta já se encontra é preciso de escritores como vc q nos leva uma mens. de respeito&amor a natureza e também aos nos irmãos indigenas,tenho certeza
    q este livro irá abrir as portas ao projeto ribeirinhos pois uma pessoa 100% do bem como vc
    o universo só irá conspira a favor, muita luz, paz&união,how!mitaku yeoyasim
    abços moacir lima
    chapada diamantina

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